de açúcar

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

aprende e continua aprendiz
ensina muito e reboca os maiores amigos
faz dança, cozinha, se balança na rede
e adormece em frente à bela vista

-que horas são? – perguntou distraidamente, espreguiçando-se.
havia adormecido com a mesma roupa do dia anterior, mas não se importava com isso. a preocupação era saber se havia cafeína ali.
cafeína, e um pouco de amor. para colher o dia.
para sustentar o peso de sua alma e de seus encantos, que transpareciam calmamente através de um par de olhos sonolentos.
“são de ressaca” – murmuraria entre os dentes algum machadiano amargurado.
“não; são janelas” – acertaria qualquer romântico empoeirado. se fossem de comer, teriam gosto de doce de padaria. suspiro. suspiravam.
quando passava, deixava atrás de si paz e cheiro de terra molhada-de-chuva-de-verão.
...esguia, de mãos e traços decididos. desleixadamente delicada, de riso largo e contagiante. crua.pura.
parece mais uma Flor cor de pôr-do-sol.
-meio-dia.
mas a resposta já não fazia sentido. ela voltava para os seus sonhos, sem pressa.

sobre clichês e/ou desamores

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

seus suspiros reverberavam nos quatro cômodos daquela casinha de vigas soltas, mais mal apertadas que a razão por estar ali, nua.
os corpos ajeitavam-se quase no fim de uma ruela, onde os sons ecoavam até chegar aos ouvidos ébrios de um pierrot atordoado. como pôde, amar essa prostituta? queria envolver suas mãos em volta daquele pescoço tão... tão doce. podia sentir seu perfume misturar-se em meio aos gemidos que aumentavam.
- Colombina!
- mas com que diabos... quem te chama, Colombina?
a moça virou o rosto para o lado, exibindo suas dores e pedindo à arlequim que fosse embora.
o moço, exibia sua frustração e abotoava as calças com resmungos. Colombina era uma vadia, mas ele também não entendia de fidelidade.
e a voz... invadia a moça por dentro e por fora.
- Colombina!
...o que provocou um acesso de choro.
- pierrot, pierrot!
o palhaço - o palhaço! correu para os braços daquela mulher, que ainda cheirava à homem. outro homem. outros beijos - e cobriu os cabelos de sua amada com os seus, jurando matar arlequim. todos eles.
- por que, Colombina, por quê? - E enrolou com força uma mecha de seus fios dourados num dos dedos, puxando com delicadeza e impaciência - ou com o que homens como ele chamam de raiva.
- não pergunte... pelos deuses, não me pergunte o que eu finjo não saber!
e enterrou o rosto, lavado de lágrimas e maquiagem barata, no peito de pierrot. sentiu o seu aroma doce, e o coração bater apressado. inevitavelmente, desejou o cheiro de suor e a respiração ofegante. mas não vindas daquele rapaz, tão limpo e tão longe da simplicidade asquerosa do sexo.
mais uma vez: distorções, dentes. raiva, receio. carne e pêlos.vaidade. gritos...murmures. com uma maçã na boca.
mas aquele homem, tão suave que chegava a ser ralo, trazia, em seu lugar, um coração.
- leve para outra, meu amor! jamais encardirei o que tem de tão precioso... não, não me toque pois sou filha do pecado! Perfídia, esse seria um bom nome para mim. não soa como uma planta colorida, mas venenosa? – e aproximou-se do palhaço (do palhaço!), como uma serpente – Perfídia, meu querido... Perfídia...
insinuou beijar seus lábios, mas rapidamente caiu em descontrole. soluçava infantilmente.
- meu amor, meu amor! por que chora tanto? meu corpo, minhas lágrimas, meu coração...são seus! – sussurrou pierrot, em desespero e um quase contentamento. beijou cada centímetro de seu rosto. seus, são seus.. leve, leve...
- não seja patético, pierrot! Acerta-me no rosto e vai embora, porque sou uma puta. deixe-me escorrer pelos esgotos da volúpia!
mas hesitou logo em seguida:
-não; fique. eu vou. para sempre... adeus, mon amour.
... e saiu às pressas, escondendo o choro com as mãos.
salaud, salope, sussurrou o apaixonado, começando a gargalhar sarcasticamente; engolindo o resto de um vinho barato que achara na cabeceira daquela cama nojenta; decidindo também experimentar um pouco de luxúria. santé!