quarta-feira, 16 de outubro de 2013
Luis, irmão do Zezinho - que era gay -, era operador de
empilhadeira. Luis, com uma mão, tentava abrir um pacote de biscoitos
empilhados enquanto, com a outra, segurava a barra de ferro do ônibus lotado. Mas
Luis não conseguia, roía as unhas desde criança, e assim o plástico não cedia. Roía
de medo, de ansiedade, de tédio. Roía quando estava uma pilha. Abriu. Um senhor,
pele escura e marcada, chapéu surrado pra proteger um raio que possa vir a cair
em sua cabeça, olhou para os biscoitos. Oferece, Luis!
Oferece,
você que tem vinte e poucos anos de olhos azuis e gentis, que deixou os cabelos
encaracolados crescerem só um pouquinho, porque a família reclamou e o trabalho
olhou; oferece com a mão direita, que é a que você leva uma aliança grossa de
quem ama sua namorada, de quem vai casar assim que der entrada na casinha. Você
que deixa ela trabalhar, que tem barriguinha de equilibrar os sobrinhos em pé,
de quem almoça na casa da vó aos
domingos e pede a benção.
O senhor
aceita, agradece e comenta que não almoçou. Missão cumprida, Luis, você não
quis ser coroinha, mas jamais deixou de ser um bom cristão. Toma a cervejinha só
aos sábados com o sogro, porque ele insiste. Porque ela gosta de vê-los
conversando. Luis fala das empilhadeiras, porque não sabe nada de futebol. Luis
olhava para a estrada, enquanto colocava o último biscoito na boca, enquanto
imaginava a casinha e as fotos do casório. Ao engolir, sentiu ânsia. Luis engolira
ar, viu o lobo das estórias esvaziar os móveis da casinha; teve o ímpeto de abraça-lo
e pedir socorro. Um baque forte, um clarão, e Luis vomitou. Reconheceram-no
pelo crachá que carregava no peito, agora transpassado por uma barra de ferro. Bem
a tempo, Luis!